Hoje estava indo a pé para a academia quando vi uma mulher caída na calçada gritando por ajuda. Ela estava defronte a um estacionamento na Engenheiro Rodolfo Ferraz, aparentemente sem nenhum ferimento, mas agitada. Atravessei a rua, ela estava um pouco confusa, comecei a conversar com ela, sabia dizer seu nome, onde estava e de onde vinha.
Em seguida, uma moça de uns 15, que também passava ali decidiu parar e oferecer ajuda. Um transeunte sentou-se ao lado dela e começou a conversar, logo estavam os dois cantando, ela entoava algumas palavras, que pareciam letras de um hino de louvor, ele, tentava (com muita habilidade) acompanhá-la, e, com isso, aos poucos ela foi se acalmando.
Ele seguiu segurando a mão dela. Enquanto isso, Júlia (a moça de uniforme do Energia) me ajudava, pegou na mochila da escola uma caneta, anotamos alguns números e procuramos ligar para pedir ajuda. Junto a nós, os funcionários do estacionamento se colocaram à disposição.
Ligamos para Polícia, disseram que não tinham o que fazer, e que devíamos ligar para os Bombeiros, que disseram para ligar para o SAMU (😶).
Ligamos para o SAMU, nem precisamos dizer o nome dela:
– “é a dona C.? já atendemos ela duas vezes hoje”
– “E, aí, faz o que? ”
– “Não tem o que fazer, ela não aceita ser atendida nem levada para o hospital – quando pedimos para que fosse nos agrediu”
Ligamos para o CAPS, novamente não precisei identificá-la…
“é a dona C.?”, “já atendemos ela hoje”, “pedimos que ficasse, mas ela quis ir embora”
A situação era triste, aquela senhora sob efeito de psicotrópicos (relatou o que tinha usado), sem aceitar ajuda do SAMU, do CAPS…
Os dois homens do estacionamento, o outro transeunte sentado no chão cantando com ela, Júlia e eu sem saber o que mais poderíamos fazer para ajudá-la. Expliquei que ninguém viria buscá-la, entreguei o número do telefone de sua tutora, que consegui no CAPS, – mas que não respondia nosso chamado. Carregava pendurado no pescoço uma identificação para passe livre. Deixamos ela sentada de maneira mais confortável possível e com um sentimento de frustração nos despedimos dela e seguimos nossos caminhos.
Uma hora mais tarde voltei para ver como ela estava e fui informada que assim que saímos ela levantou-se e saiu dançando e cantando pela rua. Menos mal. Fui abordada por um homem que andava pela vizinhança, ele me disse que a “dona C.” tem o hábito de se jogar no chão, muitas vezes fingindo desmaio, para ganhar atenção das pessoas.
Pobre “dona C.”! Espero que ela siga encontrando pessoas como a doce Júlia que foi a procura de água, como o homem que sentou no chão e ficou o tempo todo ao lado dela cantando, os homens do estacionamento que emprestaram o telefone para fazermos as ligações e, com isso, cada um de um jeito diferente, ofereceu acolhimento neste momento de sofrimento emocional. Sigo pensando na “dona C.”.
Publicado no Facebook em 07/07/2017, por Maria Júlia Zimmermann (@psicologamariajulia_)
Imagem em destaque: A mulher velha de Arles, Vincent Van Gogh (1888)